US$ 700 bilhões em termos reais

David Stout, em Washington, EUA

"Um bilhão aqui, outro acolá, e logo você estará falando sobre dinheiro de verdade". A famosa frase do senador Everett McKinley Dirksen, republicano de Illinois, foi pronunciada há muito tempo (ele morreu em 1969), antes que jogadores de beisebol com mãos pesadas ganhassem milhões de dólares por ano na liga principal, numa época em que US$ 1 bilhão era de fato muito dinheiro.

Mesmo levando em conta a inflação e o contexto dos gastos federais atuais, US$ 700 bilhões é uma soma enorme. Ela representa mais de US$
2.000 dólares para cada homem, mulher e criança dos Estados Unidos.
Colocando de outra forma, US$ 700 bilhões são mais do que o Produto Interno Bruto anual da Argentina e Chile juntos, de acordo com almanaques atuais.

Representam quase 70% do PIB do Canadá.

Mas para ficar verdadeiramente impressionado com o verdadeiro valor de US$ 700 bilhões, basta olhar para quanto dinheiro o governo dos Estados Unidos gasta em programas sociais e, pior ainda, o quanto ele gastou em guerras ao longo dos anos.

A soma é mais ou menos o quanto o Pentágono espera gastar no ano fiscal que termina em 30 de setembro, incluindo os custos das campanhas no Iraque e Afeganistão. A informação é do Centro de Controle e Não-Proliferação de Armas, um grupo de pesquisa de Washington, que citou números do Serviço de Pesquisa do Congresso e dados do Departamento de Administração e Orçamento.

O grupo calcula que os Estados Unidos gastaram US$ 670 bilhões (em dólares de 2007) na guerra do Vietnã, portanto a cifra que circula hoje em Washington seria suficiente para pagar pelo conflito novamente, em dinheiro e em lágrimas.

Novamente, calculando em dólares de 2007, US$ 700 bilhões seriam suficientes para pagar mais de 20% do que os Estados Unidos gastaram na Segunda Guerra Mundial, diz o grupo de pesquisa. A soma é quase duas vezes o que o país gastou na Primeira Guerra, e muito mais do que o dobro do que gastou na guerra da Coréia.

Os Estados Unidos gastaram meros US$ 7 bilhões, em dólares de 2007, lutando a guerra hispano-americana em 1898 - quase o mesmo valor que o governo federal gastou este ano no Programa Head Start.

Este ano, o Head Start está ajudando pouco mais de 900 mil crianças de famílias pobres, de acordo com o Departamento de Saúde e Serviços Humanos. É claro, o Head Start é popular politicamente, e geralmente visto como um dos programas mais benéficos inspirados pelo presidente Lyndon B. Johnson.

Já foi comentado que, apesar de a burocracia federal não conseguir angariar somas astronômicas de dinheiro para pagar por cuidados de saúde e outras necessidades, ela parece preparada para fazer o mesmo para aliviar um desastre financeiro, principalmente porque, do contrário, os tremores seriam sentidos muito além dos cânions de Wall Street.

E ainda há outra forma de olhar para isso: US$ 700 bilhões são mais de 40 vezes o que a NASA gastará neste ano fiscal.

Se confiarmos nos Estados Unidos, como faz o presidente Bush, poderíamos esperar que todas as hipotecas problemáticas que o governo vai comprar se transformassem em bons investimentos.

Mas voltemoso à cifra impressionante de US$ 700 bilhões. Pode-se dizer, em tese, que eles são suficientes para pagar pelo programa Head Start pelos próximos 100 anos, assumindo que todo o dinheiro será investido com sensibilidade e de forma conservadora o suficiente para acompanhar a inflação - uma estratégia de investimento aparentemente não muito popular hoje em dia.

Tradução: Eloise De Vylder

[The New York Times, 21/09/2008]
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