Educação

Em SP, a volta de Paulo Renato à Secretaria de Educação...

Humor(?!) - Angeli

A Guerra do Paraguai

Primeira (de três) parte de um interessante trabalho sobre a Guerra do Paraguai (em espanhol).

Histórias assombrosas

A vingança do morto, de Viriato Padilha. Leia clicando aqui.

A guerra do vintém

Exploradas por militantes republicanos, manifestações contra taxa sobre transporte urbano tumultuam capital do Império e deixam mortos e feridos pelas ruas
Leia o artito de José Murilo de Carvalho:
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Timothy W. Ryback*
Há três anos, os bens de Yves Saint Laurent foram leiloados por quase meio bilhão de dólares. Duas semanas atrás, um punhado de pertences pessoais de Mahatma Gandhi - óculos de aro redondo, um par de sandálias, uma tigela de arroz - foram vendidos por US$ 1,8 milhão. Na semana passada, um livro da desaparecida biblioteca pessoal de Adolf Hitler foi oferecido no famoso centro de leilão parisiense Hotel Drouot por um lance inicial de mil euros. Depois de uma rápida rodada de apostas, o volume foi vendido por € 1.800.
No caso de um Matisse de Yves Saint Laurent, vendido por € 35,9 milhões, o comprador investiu num bem cultural durável e, é claro, no bom gosto impecável do último dono. O milionário indiano que ofereceu o lance vencedor para os pertences de Gandhi disse que queria repatriar os objetos para exibição pública em seu país.
Mas o que motiva alguém a comprar um artefato de Hitler? Toda vez que pertences autênticos de Hitler vão a leilão, é inevitável e compreensível que o número de protestos se iguale ao número de apostas - acusações de especulação; críticas quanto à fetichização do líder nazista morto; inquietações quanto à natureza dos possíveis compradores ("Que tipo de pessoa compraria esse tipo de coisa?")
Com a maioria dos artefatos de Hitler, como o globo que foi vendido por US$ 100 mil, essas questões são certamente compreensíveis e justificáveis. Mas um livro da biblioteca particular de Hitler pode ser mais do que o objeto de um desejo questionável.
Hitler não era apenas um bibliófilo fanático, tendo reunido uma biblioteca de 16 mil volumes até sua morte, mas era também um leitor voraz que dizem ter lido um livro por noite durante a maior parte de sua vida adulta. Os livros eram uma parte integral do seu caráter e identidade. "Quando uma pessoa dá, tem que receber", disse ele uma vez. "E o que eu preciso, recebo dos livros".
Nesse sentido, os livros de Hitler são mais do que meros artefatos. Os volumes que ele leu e estudou, as passagens marcadas a lápis, tudo isso diz algo sobre seus interesses e sobre o curso de seus pensamentos em algumas de suas horas mais íntimas. Eles nos permitem observar este ícone do mal reduzido a dimensões humanas: um homem de meia idade numa poltrona com um livro na mão, e, vez ou outra, um lápis.
A maior parte da coleção de Hitler, dividida entre três bibliotecas elegantemente mobiliadas em suas casas de Berlim, Munique e em seu retiro nos Alpes em Obersalzberg, desapareceu na primavera de 1945, vítima da caça de troféus coletiva dos soldados americanos, franceses e do Exército Vermelho.
A parte remanescente da biblioteca, cerca de 1.200 livros - que incluem uma coleção de ensaios escrita por Gandhi - pode ser encontrada no setor de livros raros da Livraria do Congresso em Washington, D.C. Outros 80 livros, retirados do abrigo de Hitler em Berlim depois de seu suicídio, estão na Universidade Brown, em Rhode Island. Há relatos de que um número desconhecido, talvez vários milhares de livros, esteja escondido num arquivo de Moscou.
Portanto, quando volumes isolados vêm à tona - como o que foi leiloado no Hotel Druout -, eles representam exatamente o tipo de fonte primária de evidência histórica de que os estudiosos de Hitler carecem. Infelizmente, esses livros aparecem rapidamente nos leilões e depois somem em coleções privadas.
Um colecionador americano juntou dezenas de livros de Hitler, incluindo uma coleção da obra de Shakespeare em dez volumes encadernados à mão em couro trabalhado com uma suástica e as iniciais "AH" gravadas na lombada. Hitler citava Shakespeare frequentemente - "Ser ou não ser" era sua frase favorita.
Um morador do norte do Estado de Nova York comprou um livro de Hitler de um sebo por 50 centavos. O livro de 200 páginas e capa dura, "God's Realm and the World Today" [algo como "O Reino de Deus e o Mundo de Hoje"], foi publicado em 1915 e tem muitas anotações. Um colecionador holandês encontrou uma cópia surrada de Hitler do livro "Life of Frederick the Great" ["A Vida de Frederico, o Grande"] de Thomas Carlyle, uma biografia do século 19 que enaltece o fervor destrutivo do rei da Prússia e que alimentou as esperanças delusórias de Hitler em relação a uma miraculosa mudança de sorte na primavera de 1945.Hitler estava lendo Carlyle nas semanas anteriores a seu suicídio.
De acordo com o catálogo do leilão montado pela empresa parisiense Kahn-Dumousset, o livro de Hitler em oferta na semana passada era um volume de antiquário, publicado em 1712, com uma ilustração de frontispício que mostrava o "furor, guerra, ódio e discórdia" na história europeia, e contava a história dos governantes europeus desde o duque de Savoy até o rei da Prússia.
O livro foi supostamente retirado do retiro de Hitler nos Alpes por um membro da 2ª Divisão Armada da França, o que empresta ao volume ainda mais valor histórico. A casa de Hitler nas montanhas abrigava muitos dos livros mais apreciados pelo líder nazista, incluindo seus volumes de Shakespeare.
Diferente de muitos outros livros remanescentes, que contêm dedicatórias de colegas ou admiradores nazistas - Heinrich Himmler, Herman Goering, Leni Reifenstahl, para citar alguns - esse volume não tem nenhuma dedicatória, sugerindo que foi uma aquisição particular, tornando-o assim ainda mais pessoal e relevante.
Na última quarta-feira, quando o livro de Hitler foi a leilão, junto com mais de outros 200 itens de antiquário, só havia lugar para ficar em pé no Hall 11 do Hotel Druout, mas ninguém respondeu ao lance de abertura de mil euros.
Entretanto, seguiu-se uma rodada movimentada de apostas anônimas por telefone, e o livro foi finalmente vendido por € 800 a mais do que o preço inicial. O tomo belamente encapado foi removido de vista e preparado para ser enviado para seu dono anônimo.
Hitler teria aprovado. No final de sua vida, o líder nazista ordenou que seus pertences pessoais fossem destruídos numa tentativa de obliterar o máximo possível sua vida privada. Ele queria ser lembrado exatamente como havia apresentado a si mesmo para o mundo: cheio de fúria, guerra, ódio e discórdia. Ele não queria deixar espaço para nuances, muito menos para insights sobre as obsessões e inseguranças particulares que alimentavam sua personalidade.
Enquanto o Matisse de Yves Saint Laurent passou da coleção de um investidor para outro e os artefatos pessoais de Gandhi retornaram para sua terra natal como patrimônio nacional, o livro de Hitler - como muitas outras coisas que poderiam nos dar mais informações sobre essa personalidade impenetrável - foi destinado a uma obscuridade ainda maior.
* Timothy W. Ryback é secretário geral da Academia Diplomática Internacional, e autor de "Hitler's Private Library: The Books that Shaped the Man" [algo como "A Biblioteca Particular de Hitler: Os Livros que Formaram o Homem"].

Tradução: Eloise De Vylder

Os economistas e a crise

Ninguém sabe o destino dos recursos do pacote sancionado por Obama. Embora certas convergências levem a uma “vitória keynesiana”, tal resposta não atende o ponto de vista econômico. Uma coisa é possivel dizer: a reação emergencial é a versão invertida do “there is no alternative” dos 80.
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Inês de Castro - A rainha morta

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Estilo musical de extrema riqueza e versatilidade, o jazz nasceu das canções dos escravos negros americanos, em seu processo de adaptação à nova cultura, e se consagrou como forma de expressão artística universal.
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Fé e Política


Não tenho maiores informações sobre este vídeo (data, local, etc...). Mas acho que não importa: a importâncio do personagem e da mensagem falam por si.

Uma terra de descrentes, para não dizer de ateus

Peter Steinfels

Phil Zuckerman passou 14 meses na Escandinávia, conversando com centenas de dinamarqueses e suecos sobre religião. Não foi fácil.
Qualquer um que tenha observado um pouco mais sabe que a Dinamarca e a Suécia estão entre os países menos religiosos do mundo. Pesquisas de opinião sobre a crença em Deus, a importância da religião na vida das pessoas, acreditar na vida depois da morte ou frequentar a igreja mostram isso de forma consistente.
Também é notório que a Dinamarca e a Suécia dividem o primeiro lugar nas listas dos países com melhor expectativa de vida, bem-estar infantil, escolaridade, igualdade econômica, qualidade de vida e competitividade.
Apesar de bem documentados, estes dois conjuntos de fatos vão de encontro à crença de muitos americanos de que uma sociedade sem muita religião seria, nas palavras de Zuckerman, "de uma imoralidade feroz, repleta de mal e extremamente corrompida".
É por isso que ele insiste que, de certa forma, o que ele e sua mulher e filhos viveram foi basicamente o oposto: "uma sociedade - evidentemente irreligiosa - que era, acima de tudo, moral, estável, humana e profundamente boa".
Zuckerman, sociólogo que dá aulas no Pitzer College em Claremont, Califórnia, documentou suas descobertas sobre religião na Dinamarca e na Suécia no livro "Society Without God" ["Sociedade Sem Deus"] (New York University Press, 2008). As pessoas poderão ficar surpresas com suas descobertas, assim como ele ficou.
Muitos céticos que ele entrevistou, tanto informalmente quanto em sessões estruturadas, gravadas e transcritas, eram tudo menos antirreligiosos, por exemplo. Eles normalmente se recusavam a concordar com o rótulo de "ateu". A maioria de fato havia sido batizada, e muitos foram crismados ou se casaram na igreja.
Apesar de negarem a maior parte dos ensinamentos tradicionais do cristianismo, consideram a si mesmos de cristãos, e a maioria estava contente em permanecer na Igreja Nacional Dinamarquesa ou na Igreja da Suécia, ramificações tradicionais do luteranismo.
Ao mesmo tempo, eles se mostravam "normalmente hesitantes ou indispostos a falar comigo sobre religião", disse Zuckerman, "e uma vez que eram encorajados a isso, geralmente tinham muito pouco a dizer sobre o assunto".
Será que eram reticentes porque consideram religião, como os escandinavos geralmente fazem, como um assunto privado e pessoal? Será que, talvez, como argumentou um bispo luterano na Dinamarca, uma religiosidade profunda só será descoberta se alguém arranhar essa superfície taciturna?
"Passei um ano arranhando", escreve Zuckerman. "Eu arranhei e arranhei e arranhei".
E ele concluiu que a "religião não era na verdade um assunto tão privado, pessoal, mas, sobretudo, não se tratava de um assunto". Seus entrevistados simplesmente não se preocupavam com isso.
Além dessa reticência, Zuckerman encontrou o que ele chama de "indiferença benigna" e até um "total esquecimento". A palavra chave nessa descrição da indiferença benigna é "bom". A religião, na visão deles, é "boa". Jesus "era um homem bom que ensinou algumas coisas boas". A Bíblia "está cheia de boas histórias de boa moral, não é mesmo?".

Para além dessa noção de bom, existe um esquecimento total.
Dinamarqueses e suecos inteligentes e com boa escolaridade reagiram às perguntas básicas de Zuckerman sobre Deus, Jesus, morte, entre outras, como se fossem uma completa novidade. "Na verdade nunca pensei sobre isso", respondeu um dos entrevistados, acrescentando: "É divertido responder a esse tipo de pergunta sobre as quais eu nunca, nunca pensei".
Essa indiferença ou esquecimento dos assuntos religioso é às vezes seguida com sutileza. "Na Dinamarca", disse um pastor a Zuckerman, "a palavra 'Deus' é uma das mais constrangedoras que você pode dizer. As pessoas prefeririam sair peladas pela cidade a falar sobre Deus".
Um homem contou do choque que levou quando um colega, depois de alguns drinques, confessou acreditar em Deus. "Espero que você não me ache uma pessoa ruim", disse o colega.
Conformidade social ou não, Zuckerman ficou profundamente impressionado com o jeito direto com que muitas vezes seus entrevistados falavam sobre a morte, sem medo ou ansiedade, e sua notável falta de busca existencial pelo sentido da vida.
Inúmeros pensadores, tanto crentes quanto ateus, propuseram a idéia de um instinto religioso inato. Segundo eles, confrontados com o mistério da morte ou com o quebra-cabeça do sentido da vida, é inerente ao ser humano se voltar para a religião ou algo parecido. Baseado em sua experiência na Escandinávia, Zuckerman discorda.
"É possível que exista uma sociedade na qual a maioria das pessoas não teme tanto a morte", concluiu, "e ao mesmo tempo não se dedicam muito a pensar sobre o sentido da vida".
Será que esses escandinavos estão aí para provar que Sócrates estava errado e a vida sem exame definitivamente vale à pena? Zuckerman enfatiza que seus entrevistados não eram de forma alguma niilistas desesperados, mas "em sua maioria, pessoas felizes e satisfeitas" que "em geral têm vidas produtivas, criativas e contentes".
Andre Comte-Sponville, filósofo francês cujo "Little Book of Atheist Spirituality" ["Pequeno Livro da Espiritualidade Atéia"] (Viking, 2007) foi discutido aqui há duas semanas, sustenta que os indivíduos podem viver bem sem religião, mas que a sociedade, ou até a humanidade como um todo, precisa de um conjunto de limites que devem ser considerados "sagrados", pelo menos no sentido de algo "que justifique, se necessário, o sacrifício de nossas vidas".
Uma fidelidade a valores herdados, uma "não-religiosidade" que é "mais do que uma casca vazia ou uma forma elegante de amnésia" é a resposta ateísta de Comte-Sponville para sua própria pergunta: "O que restará do ocidente cristão quando deixar de ser cristão?".
Ele poderá encontrar encorajamento na Escandinávia e na descrição de Zuckerman da "religião cultural" que descobriu lá. Os entrevistados afirmam que o cristianismo parece ter tudo a ver com "feriados, músicas, histórias e comida" mas pouco a ver com Deus ou Credo, tudo a ver com rituais que marcam importantes passagens da vida mas pouco a ver com os significados religiosos desses rituais.
Outros podem ficar confusos ou até mesmo repelidos por essa aparente dissonância, mas Zuckerman, comparando-a à experiência de muitos judeus nos Estados Unidos e Israel, faz um esforço para compreendê-la, e sugere que isso merece muito mais estudo em todo o mundo.

Essa religião cultural pode explicar em parte os aspectos da Dinamarca e da Suécia que ele admira.
Em certo ponto, ele pergunta a Jens, um ateu de 68 anos, sobre as fontes da cultura extremamente ética da Dinamarca. Jens responde: "Somos luteranos em nossas almas - eu sou um ateu, mas ainda tenho as percepções luteranas de muitos: de ajudar nosso semelhante. Sim. É uma idéia moral velha e boa."

[The New York Times, 01/03/2009]

Mistério da "terra dos gêmeos" no Brasil: Algo na água? Mengele?

Alexei Barrionuevo, em Cândido Godói

No alto do morro atrás da casa de sua família, Derli Grimm ajoelhou-se e tomou um gole de um tubo preto fino vindo de uma nascente de água natural.
Como tantos outros neste vilarejo rural, quase inteiramente de imigrantes alemães, Grimm, 19, acredita que há algo na água -talvez um estranho mineral- responsável pela extraordinária concentração de gêmeos.
"Não dá para explicar tudo por genética", disse Grimm, que também é gêmeo.
Os geneticistas gostariam de discordar, mas tampouco têm uma explicação completa para os 38 pares de gêmeos entre as 80 famílias que moram em uma área de quatro quilômetros quadrados.
O mistério persistiu por décadas, atraindo a atenção internacional e inspirando livros e investigações por geneticistas. Essa é uma das razões pela qual os moradores não estão com pressa de tentar provar sua teoria sobre a água. Eles estão muito ocupados posando para jornalistas e atraindo turistas com seu título da "capital dos gêmeos do mundo."
Alguns pesquisadores sugeriram a possibilidade mais sombria que Josef Mengele, o médico nazista conhecido como "anjo da morte", estava envolvido. Segundo os moradores, Mengele andou por esta região no sul do Brasil posando como veterinário nos anos 60, em torno do início da explosão da ocorrência de gêmeos.
Em um livro publicado no ano passado, um jornalista argentino, Jorge Camarasa, sugeriu que Mengele conduziu experimentos com mulheres do local que resultaram em um índice mais alto de gêmeos, muitos deles louros de olhos claros. Os experimentos, segundo os moradores, podem ter envolvido novos tipos de drogas e preparações, ou até a inseminação artificial que Mengele alegava conhecer em vacas e humanos.
Entretanto, nem Camarasa nem qualquer outro defensor da teoria de Mengele foi capaz de provar que o fugitivo nazista conduziu experimentos em Cândido Godói. Mengele, que morreu no Brasil em 1979, era famoso por seus experimentos muitas vezes fatais com gêmeos em Auschwitz, um esforço ostensivo para produzir uma raça ariana superior para Hitler.
"As pessoas que estão especulando sobre Mengele o fazem para vender livros", disse Paulo Sauthier, historiador que dirige o museu local. "Ele estudou o fenômeno dos gêmeos na Alemanha, não aqui".
Um cartaz na entrada de Cândido Godói diz: "Cidade jardim e cidade dos gêmeos". Mais de 80% de seus 6.700 moradores tem descendência alemã. Eles começaram a chegar em torno da Primeira Guerra Mundial, atraídos pela perspectiva de terra barata, clima agradável e incentivos do governo brasileiro para colonizar a região.
O fenômeno dos gêmeos está centrado no assentamento de 300 pessoas de São Pedro, parte de Cândido Godói onde moram os Grimm. Sauthier, gêmeo, nasceu aqui em 1964. Sua mãe, da família Grimm, vem de uma das oito famílias originais que se estabeleceram em São Pedro em 1918.
Mesmo hoje eles vivem em relativo isolamento. Ainda usam carros de boi na lavoura e falam um dialeto alemão entre si.
Foi no início dos anos 90 que a alta proporção de gêmeos foi observada. Logo, as câmeras chegaram de toda parte. Líderes da cidade declararam São Pedro como o local com a mais alta concentração de gêmeos do mundo. (Um porta-voz do livro de recordes Guinness não pôde confirmar essa alegação, dizendo que o Guinness não acompanhava essa categoria).
Hoje, os moradores apreciam a atenção. No ano passado, na sexta festa bianual dos gêmeos, eles ergueram uma estátua de uma mulher segurando um menino num braço e uma irmã gêmea no outro e instalaram uma fonte da fertilidade que acende à noite.
Como muitos outros gêmeos aqui, Fabiane e Tatiane Grimm, 22, tiram fotos para caçadores de gêmeos desde pequenas. Quando um jornalista e um fotógrafo apareceram sem avisar, sua mãe chamou-as no estábulo para que tomassem banho antes de tirarem as fotos.
"Não é um mistério para mim", disse Fabiane, cuja família tem cinco pares de gêmeos. "Meu irmão se casou com uma prima de terceiro grau. Há muitos casos assim, as pessoas casam com primos ou outros familiares próximos."
Entretanto, para alguns, o mistério permanece. Há uma década, Anencir Flores da Silva, médico da cidade e ex-prefeito de Cândido Godói, procurou resolvê-lo e, desde então, entrevistou mais de 100 pessoas. Ele acredita que as pessoas esconderam informações sobre Mengele.
"Em uma região cheia de nazistas, alguns mantêm silêncio, por medo", disse o médico. "É importante descobrirmos a verdade."
O livro que ele ajudou a escrever sobre os gêmeos, publicado em 2007, conta sobre várias visitas que Mengele fez à região, usando nomes falsos.
"Estou convencido de que Mengele esteve na região observando o fenômeno dos gêmeos", disse Silva. Segundo ele, um homem que se identificou como Rudolf Weiss atendeu mulheres com varizes e algumas vezes prestou serviços odontológicos. Alguns moradores disseram a ele que um alemão ia de casa em casa com um laboratório móvel, coletando amostras e atendendo as mulheres.
Sauthier, o historiador, disse que não havia provas para tanto e que a comunidade alemã não merecia ser associada a "um criminoso como Mengele".
"Não há simpatizantes nazistas nesta região", disse ele, apesar de admitir um interesse histórico pelos artefatos nazistas, inclusive uma lata de leite de metal de 1937 com uma suástica em seu museu e uma foto de crianças em Cândido Godói segurando bandeiras com a suástica, incluída no livro de Silva.
Geneticistas dizem que a explicação mais provável para os gêmeos é o isolamento genético e o entrecruzamento. Dra. Úrsula Matte, geneticista de Porto Alegre, descobriu que, de 1990 a 1994, 10% dos nascimentos de São Pedro foram de gêmeos, comparados com 1,8% do Estado do Rio Grande do Sul.
Não há evidências do uso de contraceptivos ou drogas de fertilidade entre as mulheres. Entretanto, uma predisposição genética aos gêmeos seria mais provável se a maior parte dos pares fosse idêntica, derivada de um único óvulo fertilizado. Em vez disso, Matte observou que a maioria era de gêmeos fraternos, produzidos pela fertilização de dois óvulos por dois espermatozóides; tais gêmeos são associados com fatores como etnia, idade materna e histórico familiar. Entretanto, Matte não chegou a conclusões firmes para explicar o fenômeno em São Pedro.

Então, a especulação continua.
Sauthier acredita que as nascentes de água privadas como a que Derli Grimm usa contêm um mineral que afeta a ovulação. "Até hoje, ninguém avaliou a água", disse ele, observando que, na última década, a cidade passou a usar água de poço, explicação possível para o recente declínio dos nascimentos de gêmeos.
Testar a água das nascentes seria caro e exigiria alguma hipótese que indicasse o que procurar, disse Matte. Ela duvida que a cidade promova fortemente esse tipo de análise. "Eles gostam de manter o mistério", disse ela.

Tradução: Deborah Weinberg

[The New York Times, 24/02/2009]