No Afeganistão, sob o domínio dos talebans

Jacques Follorou
Logo acima das árvores, dois helicópteros de combate dão voltas como duas vespas. Seus ruídos ressoam na planície. Em solo, por um labirinto de casas e de muros de barro, talebans fogem. Eles acabam de abrir fogo sobre uma patrulha da polícia afegã. Protegidos pelas árvores, eles fogem na direção do vilarejo de Sangsar, situado a algumas dezenas de quilômetros de Candahar, a segunda maior cidade do Afeganistão.

Sangsar é o vilarejo natal do mulá Omar, líder dos talebans afegãos, refugiado na cidade paquistanesa de Quetta, do outro lado da fronteira. Foi em Sangsar, no distrito de Zhari, que a história dos talebans começou. Ainda hoje, é de lá que vem grande parte dos comandantes talebans da região. É um grande vilarejo que parece com todos os outros da região. Quase 30% dos campos do setor são cobertos de papoulas. O trigo e as vinhas, empoleiradas em profundas trincheiras, completam uma paisagem árida. Em volta, mais de 900 pequenos vilarejos de barro, habitados por uma população pobre e analfabeta.

Lá, somente as forças especiais ousam se aventurar. As tropas da Otan e o exército afegão não põem os pés ali. Os caminhos e as estradas que levam até lá estão repletos de bombas caseiras enterradas. Aqui, o talebans estão em casa. Eles cresceram, e a população os vê como resistentes frente a uma força de ocupação estrangeira e um governo corrupto.

No centro do distrito passa a estrada 1, ligando Candahar a Herat, que com a volta dos talebans se tornou a via mais perigosa do país. "Nós controlamos a estrada 1 e as bases que a balizam, mas pode-se efetivamente dizer que o interior das terras está sob controle taleban", admite o major canadense Alex Watson, no Camp Wilson, no coração do distrito de Zhari. "Nosso objetivo é ajudar o exército afegão a retomar o controle desse território e não mais simplesmente iniciar operações pontuais".

Todos os dias, entretanto, os soldados e os policiais afegãos, bem como as forças da Otan, são tomados como alvos nesse eixo. Em 16 de novembro, a dois passos do acampamento fortificado da Otan de Senzarai, talebans explodiram a estrada quando um comboio americano passava. O traçado dessa estrada está pontuado de vestígios de explosão.

Em 18 de novembro, balas passaram rentes a soldados afegãos e seis canadenses de guarda em um posto de controle na estrada 1. O tráfego não para, os carros, as carroças, as bicicletas prosseguem seu caminho como se nada tivesse acontecido. As crianças, se muito, lançam um olhar preocupado na direção dos combates. No dia seguinte, no mesmo lugar, os mesmos soldados canadenses foram alvo de foguetes . "Não podemos perseguir os insurgentes", explica o capitão canadense Jeremy Brooks, "há muitos riscos de emboscada e as bombas caseiras são a principal ameaça para nós". Um policial afegão morreria no dia seguinte na estrada apontada pelo capitão. Uma mina.

A noite pertence completamente aos talebans. Um toque de recolher informal é imposto à população de Zhari após as 21h00.As companhias de telefonia móvel do país, sob ameaça, fecham sua rede a partir das 17h00, impedindo os habitantes de informarem as autoridades sobre a movimentação noturna dos talebans. Na noite de 16 de novembro, oito policiais foram queimados vivos, trancados em um quarto por talebans que usavam uniformes da polícia. "Dois policiais do acampamento haviam informado os talebans; graças a Deus os meus são de confiança", comenta, perturbado, diante de uma xícara de chá fumegante, Sheikh Mohammad, chefe do posto vizinho de Baghi Pul.

O chefe do Estado-Maior Conjunto, almirante Michael Mullen, afirmava na quarta-feira (2), diante do Congresso americano, que os insurgentes talebans controlavam 11 das 34 províncias afegãs. Seu domínio não é só sobre a segurança pública. "Eles se dizem igualmente dispostos a assumir a gestão do país", ressalta, em Candahar, o Comitê de Relações Tribais (TLO, sigla em inglês), organização afegã reconhecida pela ONU, que tenta consolidar a estrutura tribal. Os talebans substituíram todos os postos oficiais. "É um problema", conta Mohammad Sarbidi, chefe do distrito de Zhari, "como as pessoas têm raiva do governo e da Otan, elas procuram os talebans que têm seu próprio chefe de distrito, seu próprio governador".

"O movimento taleban muitas vezes é mais eficaz que o governo", dizem na TLO. "Eles transcendem as divisões étnicas das tribos, o que confere uma maior equidade a suas decisões". No distrito de Zhari, 80% dos conflitos privados são resolvidos por um conselho de sete sábios talebans ao qual os habitantes podem se dirigir, muitas vezes por brigas ligadas a questões de terra ou de família.

Segundo o vice-governador de Candahar, o Dr. Homayun, "mais de uma centena de talebans vivem permanentemente no distrito de Zhari". Uma presença que aumenta muito na primavera e no verão, durante a estação quente propícia aos combates. Os insurgentes dormem então do lado de fora, escondidos nos sulcos dos vinhedos.

Djabal Agha, o atual líder dos talebans em Zhari, vem de Sangsar, assim como seu braço direito, Zarghai. Eles supervisionam o conjunto das atividades do distrito e sua influência se estende até Candahar. Em torno deles gravitam soldados e pequenos comandantes locais disciplinados, entre os quais Kaka Abdul Khaliq, que goza de uma boa reputação entre a população de Pashmul, um vilarejo no coração do distrito de Zhari. Em compensação, as tarifas de Kouchnai Kaka são denunciadas pelos habitantes e lhe valeram o apelido de "Açougueiro".
Soldados americanos descansam durante missão noturna na província de Kunar, em 12 de agosto

Para deter o poder crescente dos talebans, os americanos decidiram dar as cartas em todo o sul do Afeganistão, tentando conquistar o apoio das populações. Em 21 de novembro, pela primeira vez, na base de Wilson, uma assembleia (shura) reuniu cerca de quarenta chefes de vilarejo do distrito de Zhari e dois generais, um britânico e um americano. O objetivo era apresentar aos afegãos condolências pelas mortes e pelos feridos civis atribuídos às tropas da Otan. O encontro foi acima de tudo a ocasião, para os afegãos, de recitar a lista de seus descontentamentos. "Vocês nos perguntam o tempo todo o que queremos", disse Haji Abdullah, um chefe de vilarejo, "mas nós só queremos viver, ou melhor, sobreviver, deixem-nos em paz".

O capitão americano Lamb, que chegou há dois meses em Senzarai com reforços, crê na volta da relação de forças. Vindo do Iraque com sua companhia, ele mede, entretanto, as dificuldades puramente afegãs. "É pena que tenham retirado as armas das famílias, no Iraque, isso nos ajudou; lá, podia-se entrar em qualquer casa, a qualquer hora; aqui, é preciso fazer pausas o tempo todo". Mas seu otimismo não foi afetado: "Desde que fiz a segurança da estrada 1, entro nas terras com o exército afegão. Para isso, conto com meu único aliado em toda Zhari, o homem forte de Senzarai, Haji Lala".

Haji Lala está lá por falta de outro. Se seu irmão, Habibullah Jan, não tivesse sido morto, no verão de 2008, pelos talebans de Zhari, ele não teria que receber a tocha que parece lhe ser um peso. Habibullah era um antigo chefe de guerra que ficou rico graças às taxas recolhidas ilegalmente sobre o comércio ambulante na estrada 1 e à violência de sua milícia privada. Com a fortuna feita, ele podia exercer um papel tribal e político na região, e até mesmo fazer oposição à família Karzai.

Perto da escola de Senzarai, onde ainda se veem os livros escolares abandonados às pressas pelas crianças quando os talebans invadiram para fechá-la, Haji Lala descansa na casa do chefe de polícia. É o único lugar, na frente de sua casa, onde ele pode ir sem proteção. Duas semanas antes, ele escapou de uma emboscada. "Aqui, os talebans são a superpotência; todo esse tempo, desde 2001, para chegar a isso, é um grande fracasso", ele se lamenta em voz suave.

Na região de Zhari, "as pessoas protegem e alimentam os talebans, e elas não podem dizer não", conta Haji Lala. Eles recolhem o imposto sobre as transportadoras, as pequenas empresas locais ou nacionais ou até mesmo dos traficantes de drogas. Alguns antecipam o pagamento para comprar sua tranquilidade. Assim como Abdullah, que foi a Quetta conseguir a intervenção dos chefes talebans a fim de cessar os ataques sobre seus caminhões no distrito de Panjwayi, vizinho do de Zhari.

Uma vez conseguido o acordo, ele pensava que o haviam esquecido, até o dia, no início de 2009, em que os talebans vieram a seu escritório em Candahar, pedindo-lhe que pagasse sua dívida. Desde então, ele vive no Paquistão e quando ele vem a Candahar, ele se disfarça e viaja de triciclo.

A cidade de Candahar já é uma terra taleban. Nenhum ocidental passeia a pé pelas ruas da cidade. Mesmo os afegãos sabem aonde não ir. Um bairro inteiro, Aba Sabad, é proibido aos rostos estrangeiros. Ele fica à margem da prisão de Sarposa, retalhada há um ano por uma explosão que permitiu a fuga de mil talebans. Os que foram recapturados começaram, no início de novembro, uma greve de fome para denunciar o uso da tortura. "Há 37 entradas na cidade, não temos policiais o suficiente para garantir a segurança da cidade", lamenta o vice-governador da cidade, o Dr. Homayun.

O aeroporto de Candahar, situado na base da Otan, também não é poupado. "Antes, os talebans não ousavam se aventurar lá, agora eles colocam bombas quase na frente da saída da base e, em 11 de novembro, eles vieram até meu vilarejo para bater em um rapaz porque ele trabalhava ali", conta Rahmatullah, um dos chefes de vilarejo do distrito de Arghistão, vizinho da base.

Raio-X do Afeganistão
Área: 652.230 km² (sem saída para o mar)
População: 33 milhões
Urbanização: 24% da população é urbana
Taxa de fertilidade: 6,5 crianças nascidas por mulher (4º maior do mundo)
Mortalidade infantil: 151 mortes por 1000 nascimentos (3º maior do mundo)
Expectativa de vida ao nascer: 44,5 anos
Grupos étnicos: pashtun (42%), tajik (27%), hazara (9%), usbeque (9%) e outros
Religião: sunitas (80%), xiitas (19%), outros
Alfabetização: homens, 43%; mulheres, 12%
Taxa de desemprego: 40%
Fonte: CIA World Factbook 2009

Tradução: Lana Lim

[Le Monde, 04/12/2009]
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