Nova lei do Arizona reacende batalha pela reforma da imigração

Randal C. Archibold, em Phoenix, Arizona (EUA)
A governadora do Arizona, Jan Brewer, sancionou em lei na sexta-feira o projeto mais duro do país sobre imigração ilegal; sua meta é identificar, processar e deportar os imigrantes ilegais.

A medida provocou protestos imediatos e reacendeu a batalha divisora em todo o país em torno da reforma da imigração.

Mesmo antes da governadora sancionar a lei em uma coletiva de imprensa ocorrida à tarde aqui, o presidente Barack Obama a criticou fortemente.

Falando em uma cerimônia de naturalização para 24 militares do serviço ativo no Jardim das Rosas da Casa Branca, ele pediu por uma reforma federal das leis de imigração, que os líderes do Congresso disseram estar preparando para tratar em breve, para evitar “a irresponsabilidade dos outros”.

A lei do Arizona, ele acrescentou, ameaça “minar as noções básicas de justiça que prezamos como americanos, assim como a confiança entre a polícia e nossas comunidades, o que é crucial para a manutenção de nossa segurança”.

A lei, que defensores e críticos dizem ser a medida de imigração mais ampla e mais rígida em gerações, tornaria o não porte de documentos de imigração em crime e daria à polícia amplo poder para deter qualquer um suspeito de estar no país ilegalmente. Os oponentes a chamam de um convite aberto ao molestamento e discriminação contra latinos, independente de seu status de cidadania.

O debate político que levou à decisão de Brewer e as críticas de Obama à lei –presidentes muito raramente discutem uma legislação estadual– ressaltam o poder do debate da imigração nos Estados ao longo da fronteira mexicana. Ele pressagia as discussões polarizadas que aguardam o presidente e o Congresso quando tratarem da questão nacionalmente.

O Ministério das Relações Exteriores do México disse em uma declaração que teme a respeito dos direitos de seus cidadãos e das relações com o Arizona. O arcebispo católico de Los Angeles chamou de nazismo o poder das autoridades de exigir documentos.

Enquanto centenas de manifestantes se reuniam, em grande parte pacificamente, na praça do Capitólio, a governadora, falando em um prédio do governo a poucos quilômetros de distância, disse que a lei “representa outra ferramenta para nosso Estado usar para resolvermos uma crise que não criamos e que o governo federal se recusa a consertar”.

A lei entrará em vigor 90 dias após o término do ano legislativo –o que significa em agosto. A lei provavelmente será contestada na Justiça.

Os latinos, em particular, que foram há não muito tempo cortejados pelo Partido Republicano como um bloco eleitoral indefinido, se mobilizaram contra a lei como sendo uma receita para discriminação étnica e racial. “A governadora Brewer cedeu à margem radical”, disse uma declaração do Fundo Mexicano-Americano de Defesa Legal e Educação, prevendo que a lei criaria “uma espiral de medo, desconfiança na comunidade, maior criminalidade e processos legais caros, com repercussões nacionais”.

Apesar de ser comum a polícia exigir documentos em metrôs, estradas e em lugares públicos em alguns países, como a França, o Arizona é o primeiro Estado a exigir que os imigrantes cumpram a exigência federal de portar documentos de identidade legitimando sua presença em solo americano.

Brewer reconheceu as preocupações dos críticos, dizendo que trabalhará para assegurar que a polícia tenha treinamento apropriado para executar a lei. Mas ela apoia os argumentos dos autores da lei, de que ela fornece uma ferramenta indispensável para a polícia em um Estado de fronteira que é um dos principais ímãs de imigração ilegal. Ela disse que a discriminação racial não será tolerada, acrescentando: “Nós temos que confiar em nossa polícia”.

A governadora e outros líderes eleitos estão sob intensa pressão política aqui, exacerbada pela morte de um fazendeiro no sul do Arizona, supostamente por um contrabandista, duas semanas antes da votação do projeto de lei pelo Legislativo estadual. Sua morte foi mencionada na quinta-feira por Brewer, enquanto ela anunciava um plano que pede ao governo federal para que posicione tropas da Guarda Nacional na fronteira.

O presidente George W. Bush tentou realizar uma reforma abrangente, mas fracassou quando seu próprio partido ficou dividido em torno do assunto. Novamente, os republicanos que estão enfrentando concorrência da direita nas primárias, incluindo Brewer e o senador John McCain, estão sob tremenda pressão para apoiar a lei do Arizona, conhecida como SB 1070.

McCain, que está enfrentando nas primárias um adversário que tem a imigração como tema de campanha, só demonstrou apoio à lei horas antes do Senado estadual aprová-la, na tarde de segunda-feira. Brewer, mesmo após a aprovação do projeto de lei pelo Senado, se manteve em silêncio sobre se o sancionaria. Apesar da expectativa de que ela o faria, dado sua disputa nas primárias, ela se recusou a declarar sua posição até mesmo em um jantar na quinta-feira, para uma organização latina de serviço social, Chicanos Por La Causa, onde vários membros presentes pediram pelo veto.

Entre outras coisas, a medida do Arizona é uma rejeição extraordinária a Janet Napolitano, que vetou repetidamente uma legislação semelhante como governadora democrata do Estado, antes de ser nomeada secretária de Segurança Interna por Obama.

A lei abre um profundo racha no Arizona, com a maioria de milhares de eleitores que telefonaram ao gabinete da governadora pedindo que ela a vetasse.

Nos dias que antecederam a decisão de Brewer, o deputado federal Raul M. Grijalva, um democrata, pediu por um boicote da convenção em seu Estado.

O projeto de lei, de autoria de Russell Pearce, um senador estadual e um agitador em questões de imigração, tem vários artigos.

Ele exige que os policiais, “quando viável”, detenham as pessoas que eles suspeitem, de forma razoável, que estejam no país ilegalmente e verifiquem seu status junto às autoridades federais, a menos que fazê-lo atrapalhe uma investigação ou um tratamento médico de emergência.

A lei também transforma em crime estadual –uma contravenção– não portar documentos de imigração. Além disso, ela permite que as pessoas processem as prefeituras ou agências caso acreditem que a lei estadual ou federal de imigração não esteja sendo cumprida.

Estados por todo o país propuseram ou aprovaram centenas de projetos de lei tratando da imigração desde 2007, a última vez em que um esforço federal para reforma da lei de imigração fracassou. No ano passado, houve um número recorde de leis aprovadas (222) e resoluções (131) em 48 Estados, segundo a Conferência Nacional dos Legislativos Estaduais.

A perspectiva de mergulho em um debate nacional de imigração está sendo cada vez mais discutida no Capitólio, promovida em parte pelas recentes declarações do senador Harry Reid, democrata de Nevada e líder da maioria, de que pretende apresentar uma legislação no plenário do Senado após o Memorial Day (dia em homenagem aos militares mortos no serviço ativo, celebrado na última segunda-feira de maio).

Mas apesar do debate da imigração poder ajudar a mobilizar os eleitores latinos e fornecer benefícios políticos para os democratas em dificuldades, que estão buscando a reeleição em novembro –como o próprio Reid– ele também poderia mobilizar os eleitores conservadores.

Também poderia desviar a atenção dos democratas de outras prioridades, como a medida de energia que a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, descreveu como sendo seu assunto principal.

Reid se recusou a dizer na quinta-feira que a lei de imigração é mais importante que a de energia. Mas ele a chamou de um imperativo: “O sistema está quebrado”, ele disse.

Pelosi e o deputado Steny H. Hoyer, democrata de Maryland e líder da maioria, disseram que a Câmara discutirá a política de imigração apenas se o Senado produzir um projeto de lei primeiro.

Tradução: George El Khouri Andolfato
[The New York Times News Service, 25/04/2010]
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