O diário íntimo de Eillen, uma holandesa voluntária nas fileiras da Farc

Marie Delcas, correspondente em Bogotá
Na foto, Eillen é uma mulher encantadora. "Sinto-me como se eu tivesse nascido para viver neste lugar. A selva é a minha casa", escreve, no seu diário. Mas esta jovem holandesa, que está alistada já faz mais de quatro anos nas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc, extrema-esquerda), também relata a sua desilusão. "Que espécie de organização é esta onde alguns poucos têm dinheiro, cigarros e guloseimas, enquanto os outros só têm o direito de se fazer achincalhar?", pergunta a si mesma.
No domingo, 2 de setembro, o diário "El Tiempo" publicou trechos dos cadernos pessoais da jovem, que foram apreendidos pelo exército colombiano.
"Eillen" é o seu nome de guerra. Ninguém conhece a sua verdadeira identidade. embaixada da Holanda em Bogotá ignorava a sua existência. "Agora que os jornais holandeses publicaram a sua foto, os seus parentes deverão provavelmente se manifestar", explica a jornalista Judith Bedoya, que tentou reconstituir a história de Eillen. A jovem mulher teria desembarcado pela primeira vez na Colômbia em 2000, na época em que os guerrilheiros das Farc, então envolvidos num processo de paz, ocupavam o sul do país. Fascinada pela guerrilha, ela teria se juntado às tropas da guerrilha dois anos mais tarde.
Por meio da sua escrita clara e fluente, Eillen conta o seu cotidiano e os seus humores volúveis. Ela relata as suas vontades, sua saudade de uma casquinha de fritas "em Groninguen, Amsterdã ou Utrecht", narra a espera por um helicóptero que deve ser abatido, mas "que nunca chega", descreve a "rebelde de seios grandes que vive provocando confusões" e "de quem o chefe diz que ela foi enviada pelo governo para desestabilizar o alto-comando".
"Será que eu sairei algum dia desta selva?"Eillen revela os seus amores passageiros com guerrilheiros. Ela se diz irritadíssima com a arrogância, a hipocrisia e o machismo dos comandantes. Ela zomba da obediência cega e das punições: "Ganhei um monte de multas".
Não raro, ela diz que não agüenta mais. "Estou farta das Farcs, estou cheia das pessoas daqui, cheia da vida em comunidade, cheia de nunca ter nada que seja para mim", escreve. "Tudo isso valeria a pena se somente eu soubesse por que estamos lutando. Mas eu não acredito em mais nada".
"A única pessoa que me escreve de vez em quando é mamãe, e mesmo assim ela me critica o tempo todo", queixava-se Eillen em 26 de julho de 2006. Ao que tudo indica, a sua mãe também viajou para a Colômbia. Mas a sua visita não resolveu nada. "Ao contrário, as coisas pioraram", comenta Eillen, entristecida pela cólera da sua família.
Quando a força de ataque rápido do exército regular invadiu o campo da guerrilha, no sul do país, em 18 de julho, Eillen e seus camaradas estavam nadando num rio. As mulheres conseguiram fugir, nuas ou quase, dentro dos marimbus. O seu chefe, Carlos Antonio Lozada, também escapuliu. O seu computador portátil continha, segundo o exército, "informações muito preciosas", como um vídeo em que Eillen aparece.
Em seu diário, a jovem mulher elabora uma lista de perguntas que ela faz a si mesma: "Será que eu tomei a decisão certa? Será que eu teria sido feliz se eu tivesse permanecido na Holanda? Será que algum dia eu conseguirei sair desta selva?"
Mas, entre dois momentos de desânimo, as suas convicções acabam ficando mais fortes. "Eu estou feliz aqui, com certeza", afirma. As Farc são a minha vida, a minha família. Eu não quero ir embora. Tudo o que eu quero é andar, rir, combater e cozinhar, sem me complicar a vida. Eu gostaria mais de estar numa unidade de combate".
A última frase do diário data de 17 de julho. Eillen conta maravilhas "desta experiência muito interessante que ninguém poderá me tirar".
Tradução: Jean-Yves de Neufville



[Le Monde, 05/09/2007]
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