1964: O Prof. Almir fala ao Jornal Bom Dia

De revolução a golpe, 1964 ainda é discussão polêmica
Ensino sobre assunto começou a ficar mais claro a partir de 1990

Adriana Alves, da Agência BOM DIA
Capa da ediçãoRevolução ou golpe? Embora hoje seja tratado como golpe, o movimento político militar emplacado há 44 anos, em 31 de março de 1964, foi, por duas décadas, ensinado nas escolas de ensino médio e fundamental como uma revolução, de acordo com a versão dos militares. “Até o final do governo Sarney [1990], o mais comum ainda era tratar o Golpe Militar de 1964 como uma revolução. Mas, nas universidades, esse conceito sempre foi questionado”, afirma Suzeley Kalil Mathias, 44 anos, cientista política e professora livre docente da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da Unesp (Universidade Estadual Paulista) em Franca. “Mas o significado de 1964 nunca foi consensual. Ainda hoje, há setores da sociedade que tratam o golpe como revolução, como os integrantes mais conservadores das Forças Armadas”, acrescenta Suzeley.

Para Almir Roberto Ribeiro, 47, professor de história do ensino médio, o conteúdo dos livros didáticos atuais ainda é um “pouco confuso e reducionista”.

“É reducionista tratar este movimento político militar desencadeado em 1964 como revolução ou mesmo como golpe. Foi um embate entre dois projetos de Brasis: de um lado, o nacional popular sintetizado nas reformas de base que o João Goulart pretendia promover e, do outro, o projeto dos militares, autoritário e conservador no plano político, excludente no aspecto social, mas modernizador do ponto de vista econômico”, aponta o professor.

Para ele, o Brasil atual é resultado do ocorrido há 44 anos: economicamente moderno, mas socialmente excludente.“Mesmo vivendo numa democracia, a base permanece a mesma instituída pelo regime militar há quatro décadas. Ainda há muito a avançar para superarmos os resquícios deixados pela ditadura. O Brasil ainda está entre os países com os piores níveis de distribuição de renda”, diz Almir.

Resgate sobre período é contínuo
Para a cientista política Suzeley Kalil Mathias, ainda há muito o que resgatar do que significaram os 21 anos de ditadura militar. “Embora já tenhamos conhecimento ou desconfiança sobre a maioria dos fatos ocorridos, ainda há muitas questões a serem aprofundadas ou esclarecidas, mas temos resgatado documentos e fatos importantes nesse sentido”, afirma.

Como exemplo, a cientista cita a declaração do ex-agente do serviço de inteligência do governo uruguaio Mario Neira Barreiro, 54, que teria espionado durante quatro anos o presidente João Goulart e que diz que o político teria sido morto por envenenamento a pedido do governo brasileiro. Jango, como era conhecido o presidente que governou o país de 1961 até ser destituído em 31 de março de 1964, morreu na Argentina em 6 de dezembro de 1976 – oficialmente de ataque cardíaco.

“Revelações como estas são de suma importância para resgatarmos todos os fatos históricos do período militar, para elucidarmos o que realmente ocorreu no país durante a ditadura e entendermos melhor suas conseqüências”, diz Suzeley.

‘O golpe teve antecedentes’
Embora os militares tenham tomado o poder efetivamente em 31 de março de 1964, anos antes já havia manifestações golpistas, segundo o historiador João Francisco Tidei de Lima. “Por volta de 1954, por exemplo, o presidente Getúlio Vargas, que tinha uma política econômica fortemente nacionalista, foi deposto por militares na madrugada de 24 de agosto de 1954. Ele reagiu ao golpe praticando o suicídio”, exemplifica.

“Em agosto de 1961, o presidente Jânio Quadros, empossado em 31 de janeiro, encenou uma renúncia, mas na verdade pretendia dar um golpe, que não deu certo. E como ele não conseguiu voltar ao poder, seu vice, João Goulart, que era uma espécie de afilhado político de Getúlio, acabou assumindo o governo, sob a condição de adotar um regime parlamentarista. Ou seja, o golpe de 1964 já tinha antecedentes”, explica.


[Jornal Bom Dia Bauru, 31/03/2008]
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